segunda-feira, 14 de julho de 2008

SER MAR


Meu espírito inquieto pede para estar fora de mim,
para estar em mim.
Está fora de mim quando pinto, quando escrevo,
quando me expresso, quando falo.
Está dentro de mim quando penso, quando calo.
Sinto-me passageira de mim mesma,
nessa incessante viagem:
coração-mente, mente-coração.
Ora sou barco, ora sou porto.
Já fui rio, agora sou mar.
Ser rio é buscar um leito,
acomodar-se às suas próprias margens.
Não poder ultrapassá-las.
E sendo assim, mantém-se uma tranqüilidade aparente.
Porque até os rios têm seus momentos de enchente.
O mar, seu inverso. Enche-se para esvaziar-se de novo.
Arrebenta-se a cada onda na areia e se recolhe.
Não invade, banha os pés de quem vem apreciá-lo.
De perto, de longe, é sempre possível avistá-lo.
Não há como negar, somos todos avesso e reverso
da mesma verdade do que somos.
Buscamos ser, deixamos de ser.
E nesse movimento, fazemos da vida um mar de enchente e vazante, cheia e várzea.
Mar revolto, às vezes, tranqüilo e sereno; tranqüilo e sereno, às vezes, revolto.
Prefiro ser mar.
Mas, qual rio em seu curso não se fez mar?
Qual mar, antes de sê-lo, já não foi rio?